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28 de julho de 2015

Resenha: As coisas que eu sinto só por te olhar



Este é o título do livro que marca a estreia do escritor Conrado Muylaert na literatura nacional – e, diga-se de passagem, que estreia! A obra caiu em minhas mãos por uma destas felizes casualidades do destino, e me prendeu antes mesmo que eu pudesse abrir na primeira página. Porque o título em si já conta uma história, e imediatamente coloca nossa imaginação para trabalhar.

As coisas que eu sinto só por te olhar fala de Luana, uma compositora francesa radicada em Londres que vive uma fase de esterilidade criativa, que a impede de trabalhar. Sentindo-se entediada e improdutiva pela completa falta de novas emoções – a matéria-prima fundamental de toda criação artística – Luana descobre fotografias que indicam a possibilidade de estar sendo perseguida por alguém, que misteriosamente está em todos os lugares em que ela também esteve. Esta descoberta acaba por despertar em Luana sentimentos ambíguos, motivando-a a viajar na tentativa de se reencontrar e de se reconstruir – seja enquanto pessoa, seja enquanto artista. E é no Rio de Janeiro que ela conhece Lucas, um jovem compositor por quem se apaixona. No entanto, o tão aguardado final feliz não está tão perto como pode parecer.

As coisas que eu sinto só por te olhar narra, com beleza e astúcia, toda a trajetória de um triângulo inusitado envolvendo Luana, seu perseguidor, e Lucas, sua mais nova paixão.

O livro se destaca em vários pontos, mas acredito que a maneira leve e objetiva com que o escritor Conrado Muylaert conta sua história seja o principal deles. Através de uma sutileza rara, Conrado consegue a façanha de colocar o leitor em contato direto com a obra, e com as emoções que ela desperta, envolvendo-o intrinsecamente com o seu enredo. Seus personagens também são reais e verossímeis, e por isso vibramos quando tudo dá certo, e lamentamos quando algo sai do planejado. Luana, Lucas e o seu perseguidor anônimo são gente como a gente, e assim torna-se impossível não relacionar-se intimamente com todos eles.

O livro ainda traz ao leitor uma espécie de entusiasmo aventureiro, inspirado especialmente pela maneira febril, passional e criativa com que Luana encara seus próprios fantasmas e inseguranças. Ela não é uma protagonista heroica, invulnerável e emocionalmente resistente. Muito pelo contrário. Luana compartilha conosco suas incertezas, seu tédio, seu medo do futuro, e em dado momento temos a certeza de que a conhecemos de algum lugar – quiçá do nosso próprio espelho.

Contudo, o que mais me atraiu e fascinou na obra foi, sem dúvidas, a conjunção íntima entre música e literatura; entre música e emoção; entre música e vida. As coisas que eu sinto só por te olhar é uma obra repleta de musicalidade rítmica e legítima.

A música permeia toda a obra, e é parte individual e intransferível de cada personagem. É através dela que compreendemos suas emoções e seus sentimentos, de modo que não seria exagero dizer que é a música quem traduz ao leitor a essência de toda a história. Talvez a música possa até mesmo ser considerada a verdadeira protagonista de As coisas que eu sinto só por te olhar.

Esta parceria entre literatura e música deu certo. Aliás, deu muito certo. E eu não tenho dúvida nenhuma de que Conrado Muylaert chegou para ficar entre os fortes da literatura nacional. Porque as coisas que eu senti só por ler o seu livro de estreia foram intensas, indescritíveis e, certamente, permanentes.

Leitura mais do que recomendada; leitura obrigatória para todos os amantes da boa literatura. E, claro, da boa música também.
Jana Lauxen
osdezmelhores@gmail.com

* Jana Lauxen tem 30 anos, é editora, produtora cultural e escritora, autora dos livros Uma Carta por Benjamin (2009) e O Túmulo do Ladrão (2013). Já publicou em mais de quinze coletâneas, e organizou nove, algumas em parceria com outros escritores. Atualmente trabalha na Editora Os Dez Melhores e é redatora na agência Teia de Marketing Literário Virtual.

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